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Permita-se reconciliar
Estamos vivendo a Quaresma e talvez pareça até repetitivo escutarmos ou lermos que é um tempo de conversão e de intensificar a oração e as práticas do jejum e da caridade. Mas essa insistência tem algo a nos dizer: é preciso mudar, é preciso rezar mais, é preciso ceder mais à vontade do Senhor do que aos próprios desejos, é preciso reconciliar-se com Deus e com os irmãos.
Provavelmente, você já deve ter escutado o padre ou alguém falar que é importante confessar-se nesse período e também sentiu um certo medo ou receio de procurar o Sacramento da Confissão, chamado também de Reconciliação ou Penitência.
É provável ainda que você já deva ter escutado: “ah, eu me confesso com Deus”, “imagina que vou contar meus pecados a um padre, eu me entendo com Deus”, entre outras coisas do tipo… Aqui preciso fazer um lembrete: esses pensamentos não fazem parte da fé católica. Poderíamos tratar desse assunto em muitas páginas e documentos da Igreja, mas por enquanto fiquemos com as palavras de Jesus aos Apóstolos: “Recebeu o Espírito Santo. Àqueles a quem perdoardes os pecados ser-lhes-ão perdoados; e àqueles a quem o retiverdes ser-lhes-ão retidos” (Jo 20, 22-23).
Portanto, nesse período quaresmal, permitam-se aproximar desse sacramento com o coração aberto e sem preconceitos ou receios. Para ajudar nessa tarefa, algumas palavras do Papa Francisco na sua homilia do dia 09 de março de 2020 comentando a leitura do profeta Daniel 9, 4-10: “Quando nos preparamos para receber o Sacramento da Reconciliação, devemos fazer um ‘exame de consciência’ e ver o que eu fiz diante de Deus: pequei. Reconhecer o pecado. Reconhecer o pecado não pode ser apenas fazer uma lista dos pecados intelectuais, dizer: ‘eu pequei’. Depois eu digo ao padre e o padre me perdoa. Não é necessário, não é justo fazer isso. Isso seria como fazer uma lista das coisas que eu devo fazer ou que eu devo ter ou que fiz mal, mas que permanece na cabeça. Uma confissão verdadeira dos pecados deve permanecer no coração. Confessar-se não é apenas dizer ao sacerdote essa lista: ‘Fiz isso e aquilo’, e depois vou embora. Estou perdoado. Não, não é justo. É preciso dar um passo, um passo a mais, que é a confissão de nossas misérias, mas com o coração, ou seja, que aquela lista que eu fiz de coisas ruins desça ao coração. Assim faz Daniel, o Profeta: ‘A ti, Senhor, convém a justiça; e a nós, ter vergonha’. Quando reconheço que pequei, que não rezei direito e sinto isso no coração, me vem esse sentimento de vergonha: ‘Envergonho-me de ter feito isso. Peço-lhe perdão com vergonha’. A vergonha pelos nossos pecados é uma graça, devemos pedi-la: ‘Senhor, que eu tenha vergonha’. Uma pessoa que perdeu a vergonha, perde a autoridade moral, perde o respeito pelos outros. Um desavergonhado. O mesmo acontece com Deus: resta-nos ter vergonha. A ti convém a justiça; a nós, a vergonha. A vergonha no rosto, como hoje. ‘Senhor, continua Daniel, resta-nos ter vergonha no rosto: a nossos reis e príncipes, e a nossos antepassados, pois que pecamos contra ti’. Ao Senhor nosso Deus, antes tinha dito convém a justiça, agora diz: cabe a misericórdia. Quando nós temos não apenas a recordação, a memória dos pecados que fizemos, mas também o sentimento de vergonha, isso toca o coração de Deus que responde com misericórdia. O caminho para ir ao encontro da misericórdia de Deus é envergonhar-se das coisas ruins, das coisas más que fizemos. Assim, quando vou confessar-me vou dizer não somente a lista de pecados, mas os sentimentos de confusão, de vergonha por ter feito isso a um Deus tão bom, tão misericordioso e justo”.
Peçamos hoje a graça da vergonha: de ter vergonha dos nossos pecados. Que o Senhor conceda a todos nós essa graça!
Matheus Flavio da Silva
Seminarista