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Fora de área
A melhor definição da relação que as pessoas têm mantido com seus aparelhos celulares veio de uma grande amiga minha: -Meu celular é uma extensão do meu braço! É, e ela tem razão. Eu havia me desafiado ficar por vinte e quatro horas sem o meu antes de me achar digna de escrever sobre o assunto, mas confesso que falhei – e pior – arrumei desculpas para mim mesma para justificar minha falha, coisas do tipo: “minha família pode ligar, eu preciso abrir aquele e-mail”, etc. Tudo balela.
Eu sou do tempo do telefone com fio numa mesinha na sala de casa, foi assim que me comuniquei com meus amigos na adolescência e era como eu me comunicava com meu namorado no início dos anos noventa. Hoje vivo me perguntando se não éramos mais felizes ou mais saudáveis na forma de nos comunicarmos e nos relacionarmos. Uma coisa é certa, éramos mais serenos. Acima de toda a problemática envolvida no uso dos smartphones, talvez a mais grave seja a perda da serenidade. Estamos vivendo em um universo paralelo, fabricado, irreal e ele se misturou com o que sobrou de realidade. Quando falo em realidade, me refiro ao que nossos cinco sentidos captam, e nesse ponto perdemos muito a cada dia; perdemos sabores, aromas, sons, percepções e sensações.
Não vou levantar bandeira contra a tecnologia, até porque o mundo virtual me trouxe muita gente de volta e me mantém “perto” de muita gente querida. Quero apenas propor o pensar, o equilíbrio e o alerta sobre a dependência desse tipo de equipamento. A reclamação mais comum nos dias de hoje é que as pessoas não interagem por estarem o tempo todo no celular.
Três sinais que indicam dependência:
Falta de controle O indivíduo tem a sensação de que não tem escolha, que é compelido a fazer aquilo. No caso do celular, não consegue deixar de checar o aparelho a todo instante, às vezes até durante a noite, atrapalhando o sono.
Prejuízos para a vida Só existe dependência quando o comportamento traz prejuízos ou problemas importantes, como colocar emprego, relacionamento, convívio social e familiar ou vida acadêmica em risco. A pessoa negligencia tarefas e perde qualidade de vida.
Universo restrito A dependência leva a um comportamento empobrecedor e limitante. O universo vai ficando cada vez mais restrito. Isto é, nada mais interessa além daquele comportamento ou do objeto de sua dependência. Se o uso do celular está atrapalhando outros aspectos da sua vida, fique alerta. Quantas vezes por dia você checa o seu celular?
Em todos os lugares, é possível ver pessoas que não largam o aparelho para nada, nem para comer ou assistir a um filme no cinema. Há poucos anos, a primeira coisa que se costumava fazer pela manhã era escovar os dentes ou lavar o rosto. Agora, o mais comum é verificar as notificações antes mesmo de sair da cama. Uma pesquisa, realizada no ano passado revelou que, em média, as pessoas checam o aparelho mais de cem vezes por dia. Esse hábito de não desgrudar do celular pode ser considerado uma forma de dependência. Entretanto, o problema ainda não é classificado como uma doença catalogada entre os transtornos mentais, mas nem por isso deixa de trazer consequências para os usuários mais inveterados como a perda da concentração e a incapacidade de estar atentos. Pessoas ansiosas devem tomar mais cuidado, pois são mais propensas a se tornarem dependentes. Para saber se o uso do celular está indo além do limite, é preciso analisar se o comportamento interfere nas atividades cotidianas e traz prejuízos para a vida do indivíduo.
Ainda não se sabe quais serão os efeitos dessa dependência em médio e longo prazo, porém chama a atenção para a dificuldade que algumas pessoas já apresentam em se aprofundar nos assuntos quando conversam ou ler um livro. Minha proposta a todos nós e deixarmos o aparelho desligado por vinte e quatro horas para que, nesse tempo, possamos nos perceber, nos avaliar e retomarmos o contato com o mundo e com a vida real. Quem topa? Outra dica legal é “esquecer propositalmente o celular em casa” quando sair, e perceber pode se viver sem ele, ou quem sabe, se surpreender.
Viviane Battistella,
Psicóloga, Psicoterapeuta, Especialista em Comportamento Humano e Escritora.