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sexta-feira, 19 de abril de 2024

Artigos

Fonte da Juventude

Uma das histórias mais simbólicas sobre a juventude na Mitologia Grega é a da Sibila de Cumas. As sibilas tinham o dom da profecia. Elas eram inspiradas pelo deus Apollo. Um dia, Apollo prometeu a esta Sibila conceder-lhe um desejo. Ela, então, pegou nas mãos um punhado de areia e pediu para viver tantos anos quantos fossem os grãos contidos em sua mão. O desejo lhe foi concedido, porém, ela se esquecera de pedir a juventude e então fora consumada pela idade. A lenda diz que Sibila de Cumas viveu nove vidas humanas de cento e dez anos cada uma e que teria sido vista suspensa numa gaiola, completamente emurchecida pelo tempo, proferindo repetidamente o desejo de morrer.
Muitas são as histórias sobre seres imortais. A mais recente talvez se refira à série Crepúsculo, mas existem também imortais não vampiros, como os Highlanders, que, assim como os primeiros, dependiam de um ritual específico para morrer. Viver eternamente parece tentador, mas em todas as obras podemos perceber a presença da melancolia nos que ficam quando o tempo passa e os outros mortais se vão.
A busca pela juventude eterna não é exclusividade de Ponce de Leon. As “fontes da juventude” como a dele, cuja proposta é parar o envelhecimento, estão cada vez mais comuns. Mulheres têm travado um combate constante contra o tempo, contra a gravidade e, principalmente, contra as visíveis características da idade. Quando jovens, não nos preocupamos com o envelhecimento. Crianças querem crescer logo e adolescentes não se preocupam com os efeitos nocivos do sol quando estão na piscina, nem com a presença dos radicais livres. Quando jovens, bebemos e comemos como se fôssemos imortais. Vivemos perigosamente e não temos o menor medo nem do cigarro. A juventude é desejada quando começa a ser perdida.
Ao desejar a vida eterna, a Sibila de Cumas esqueceu-se não só de que iria envelhecer, como também não pensou na solidão de continuar viva quando o seu mundo composto pelas pessoas e pelos seus hábitos não mais existissem. No final, desejou morrer. A lenda nos leva à reflexão de que, assim como a vida eterna não parece ser um bom desejo, a busca pela eterna juventude não deve ultrapassar um certo limite: o da aceitação da natureza da existência humana. Vamos envelhecer e vamos morrer. Se a vaidade pode ser um pecado bem administrado, é preciso contê-lo para que a tecnologia disponível nos dias de hoje realce a beleza que cada idade tem. A busca pela longevidade com qualidade é saudável porque parte da premissa da aceitação e, principalmente, do respeito ao organismo. O que não funciona é tentar parar o tempo, mascarando-se e fantasiando-se de jovem.
O comportamento humano se modifica e se refina com o tempo. O pensamento, os sentimentos, as percepções do mundo e as sensações aos cinquenta são diferentes das que temos aos vinte e isso precisa ser levado em conta. As experiências adquiridas na caminhada vão dar a todos nós a sensação de que, agora que já aprendemos, poderíamos estar começando, porém, neste nosso contexto de consciência e realidade, não temos essa opção disponível. Meu avô paterno, um pouco antes de partir, disse-me a seguinte frase: “Vivi, quando você entender como a vida funciona, você vai estar velha como eu estou agora, vai estar cansada e vai querer morrer, por isso aproveite e viva tudo o que puder.”
Não é a busca pela juventude eterna, nem a luta para retardar os efeitos do tempo, regada a botox e ácido retinóico que funciona. Eles funcionam sim, mas são parte de uma filosofia de vida, que entende e aceita a beleza de cada fase, que cuida da alimentação sem fazer disso uma tortura compulsiva, que faz atividade física na mesma proporção que lê, estuda, vai ao cinema, viaja e conversa com os amigos, que se dedica a amar sua família e expande esse amor para todo o mundo. Você deixa de envelhecer quando desiste da luta e aceita o tempo como parceiro e não como um oponente. Você deixa de envelhecer quando controla os medos que a idade traz.
Quando o enrugar lhe trouxer algum pânico, lembre-se da Sibila de Cumas e deseje viver antes de chegar o dia no qual desejaremos morrer. E que a vida de todos nós seja longa. E que possamos morrer como a personagem Rose do filme Titanic, sobrevivendo a todos os naufrágios. E que, quando o fim chegar, estejamos como ela, deitados numa cama quentinha, apreciando fotos e lembranças de uma vida que valeu a pena.

 

Viviane Battistella,
Psicóloga, psicoterapeuta,
especialista em comportamento
humano e Escritora.

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