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quinta-feira, 25 de abril de 2024

Artigos

Coisas que deixamos pelo caminho

Após um mês de espera, aquele garoto raquítico “voava” na sua inseparável “Monareta” rumo à livraria mais próxima – um dos exemplares da coleção acabara de chegar.
Da Agatha Christie ao Conan Doyle, do Alan Poe ao Stephen King – O que importava era o prazer de mergulhar naquelas aventuras e se embrenhar nos mistérios que só uma mente pra lá de inteligente como a do Hercule Poirot ou da Miss Marple seriam capazes de desvendar. O cheiro fresquinho do papel impresso se confundia com a ansiedade em devorar as historietas daqueles exemplares mágicos. Em sua casa, no quarto, o garoto possuía duas estantes, todas apinhadas de gibis e livros. Conhecia todos de cor e, sempre que podia, encontrava-se conferindo, um por um, os exemplares, como um guardião do tesouro fazia com suas preciosidades.
Eram tempos diferentes (década de 80) – A gurizada do bairro compartilhava e curtia as novidades literárias que o garoto levava para casa. – Interessante se envolver com a magia saída daquelas páginas ilustradas. Fascinante viajar nas histórias contadas por tantos escritores imortais: Monteiro Lobato e o seu eterno Sítio do Pica Pau Amarelo, Marcos Rey e a fascinante coletânea de histórias da Série Vagalume, Poe e o seu temível Gato Preto, Stan Lee e seus fantásticos super-heróis, sempre ocupados em combater o mal.
O destino, portanto, joga as cartas mais imprevisíveis, resultando sempre em mudanças bruscas em nossa vida. No caso do nosso garoto, as velhas estantes contendo os inúmeros livros e gibis, inevitavelmente foram varridas pelo furacão do tempo. Objetos tão significativos, como aquele livro raro que fora presenteado pelo velho pai, isso sem falar da pequena e inseparável bicicleta… O tempo não perdoa!
Existem coisas que devemos deixar pelo caminho, quase sempre. O garoto acima ilustrado é apenas um exemplo entre milhares de pessoas que viveram sua infância e, tiveram a oportunidade de vivenciar seus sonhos e prazeres.
As pessoas que um dia achávamos serem imortais, que gostaríamos que estivessem sempre presentes em nossa caminhada também são levadas pelo mesmo furacão do tempo. No início, a dor pungente da saudade, com o passar do tempo, transmuta-se em doces lembranças. E o mais importante: as lições e o exemplo dessas pessoas ficam conosco, para sempre.
Portanto, se por acaso um furacão começou a varrer coisas importantes da sua vida, não tente segurá-las. É chegado o momento em que precisamos dar aquele adeus e agradecer pelas horas e dias que tanto nos enriqueceram. Afinal, não se pode carregar tudo conosco. Fica então a essência e os exemplos que nos tornarão pessoas melhores e, mais experientes.

José Domingues
Designer Gráfico, Ilustrador e Escritor

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