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1926 – O ciclone de Itambé
Caros leitores,
Nos últimos dias assistimos pelos noticiários da TV, a um processo complexo da atmosfera, uma frente fria e o ciclone extratropical que atingem o Sul do Brasil, principalmente o Rio Grande do Sul, deixando-nos estarrecidos com a tragédia, ao deixar um rastro de destruição e desabrigados. Ao povo gaúcho a nossa solidariedade.
Uma das explicações dos meteorologistas é que, na atmosfera é frequente que massas de ar se movimentem em sentidos opostos: uma fria para o norte, e outra quente para o sul. Esse movimento gera reações, como a formação de frentes frias e ciclones.
Não obstante, nos idos de 1926, precisamente, na noite de 22 de setembro, há 97 anos, a promissora Vila de Itambé, no município de Barretos, hoje distrito de Ibitu, e, que, outrora fora Passa-Tempo, devido a passagem de peões para descanso, sofreu com um ciclone ou furacão, que arrasou metade do povoado, deixando muitos desabrigados. A Vila de Itambé, à época possuía Cartório de Registro Civil e escola municipal, entre outros. O ciclone mexeu com a alma daquele povo pacato e laborioso.
A imprensa abriu espaço e noticiou o fato, entre eles ‘O Jornal”, edição de domingo, 26 de setembro de 1926, que publicou uma reportagem especial com o título “ Destruída quasi completamente a Villa de Itambé” E prossegue: “Continua ainda angustiosa a situação em Itambé. O cyclone perturbou as situações climatéricas de toda a redondeza, tendo havido violentos temporaes em Barretos, Uberaba e Bôa Esperança […]”. (sic).
O periódico informou, ainda, que a Cruz Vermelha de São Paulo fez seguir para Barretos, o médico dr. Levino de Souza e Silva, acompanhado de um enfermeiro, para se entender com o prefeito, na época o dr. Riolando de Almeida Prado, sobre a maneira de prestar seu socorro, acolhimento e assistência aos flagelados. Felizmente não houve vítima fatal, apenas feridos leves, somente bens materiais de grande monta, destruindo metade dos imóveis ali existentes, conforme notícia estampada no jornal supracitado: “[…] Sabe-se que das 93 casas que existiam na povoação, foram destruídas 42. Até agora sabe-se que estão feridas 60 pessoas. Os prejuízos materiais são avaliados em aproximadamente em 400 contos de réis. As duas igrejas foram destruídas, não ficando da mais velha, tijolo sobre tijolo […]. As comunicações telephônicas entre Itambé e Barretos e a estrada de automóveis ficou intransitável […]”. (sic). Em meio ao nefasto acontecimento, o prefeito dr. Riolando Prado, agiu imediatamente, foi até lá, juntamente com o vice, sr. Gastão de Castro Leite. Em seguida, abriu uma subscrição para angariar fundos para socorrer os flagelados de Itambé. Entre as ações de ajuda humanitárias, o Éden Teatro promoveu espetáculo no dia 28 de setembro, em benefício da população, tendo as duas sessões lotadas; na Câmara Municipal tramitou um projeto isentando do pagamento de impostos os habitantes daquela localidade; em 20 de maio de 1927, o Governo Estadual decretou uma subvenção de 200:000$000, pagável em quatro prestações iguais, destinada à reconstrução da Vila de Itambé. Porém, até 1931, foram pagas apenas três parcelas, conforme consta do Relatório do prefeito Delcides de Carvalho, datado de junho daquele ano.
Na ocasião, diversos adágios surgiram, sobre o ciclone ou furação, entre eles o mais famoso é a ‘praga de padre’. Segundo o ditado popular, por volta de 1906, uma missão religiosa esteve em Itambé. Eles se hospedaram na única pensão da vila, de propriedade de Pedro Perene da Silva, vulgo Pedro Santana, um brincalhão de mão cheia. Estando os cavalos arreados, resolveu colocar espigas de milho e pedaços de fumo de corda sob os arreios. Quando um dos padres subiu no cavalo, pronto para a sua lida religiosa junto aos fiéis do vilarejo, o animal saiu em disparada, pulando sem parar, atirando o pobre padre ao chão.
Ele desconhecendo a brincadeira, ficou furioso, atirou sobre o povoado terrível praga que nunca foi esquecida. Vinte anos depois, a maldição se concretizaria. Sem dúvida, o ciclone era ‘praga de padre’.
Mito ou verdade, ciclone, furacão ou mesmo um forte temporal, o caso é que Itambé ou Ibitu nunca se recuperou completamente da tragédia.
José Antonio Merenda
Escritor, historiador e membro
da ABC – Academia Barretense de
Cultura – Cadeira nº 29